segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Que Democracia é Essa?

  
     Falar em democracia no cenário político atual é uma discussão interessante. Democracia vem do grego e quer dizer poder para o povo, ou seja, um governo dirigido pelos anseios populares. Porém, nota-se que num mundo dominado pelo sistema capitalista e modelo neoliberal, essa inserção do povo na vida política de uma nação é inexistente.
     Mesmo pagando impostos exorbitantes no Brasil, seus conterrâneos participam de forma inibida das decisões políticas do país. O sistema de saúde carece de enormes reformulações, já que não atende adequadamente a maioria da população. A minoria, que possui recursos financeiros, migra para o sistema privado, onde enfrentam inúmeros problemas, dependendo do plano. O sistema educacional é vergonhoso. Há anos que o país acumula insucessos nos diversos exames e mesmo assim as autoridades (in)competentes não enxergam que para promover o real desenvolvimento de uma nação é necessário investir em educação, para não se tornar dependente de países que exportam tecnologia. Enquanto isso escândalos de corrupção se proliferam e os poderes executivo, legislativo e judiciário atuam de comum acordo para a manutenção das instituições vigentes. O que há de democrático nisso tudo?
     Os problemas anti-democráticos não estão restritos apenas ao país tupiniquim. Os Estados Unidos, por exemplo, principal Estado capitalista da sociedade atual, ignora e camufla os seus princípios democráticos, não só em seu próprio território, como também em países vizinhos, principalmente os subdesenvolvidos.
     Numa sociedade capitalista não existe fronteira, esta sempre ultrapassa os seus domínios, com o intuito de dominar a política e a economia de seu suposto “aliado”. É aquilo que Octávio Ianni vai denominar de “quinta fronteira”. A nação transbordando os seus confins. Para o estudioso, poucas vezes uma nação se demarca apenas nos seus limites. Portanto, esta invasão fronteiriça será prejudicial aos povos mais vulneráveis economicamente, na qual a situação dos países subjugados da América Latina sempre estará à mercê da “boa” vontade norte-americana, em uma conjuntura que lembra o período colonial.
     Atualmente, mesmo com os países latino-americanos independentes politicamente, a situação é parecida, onde livres do jugo português e espanhol, continuam presos à política do FMI e dos banqueiros internacionais. A aliança entre essas nações já se tornou histórica, basta lembrar do alinhamento ideológico entre os americanos do norte, do sul e central. Quando este alinhamento foi contestado, o poder das armas e os militares apareceram para restabelecer a ordem burguesa.
     Durante o governo Roosevelt, este procurou adotar a política da boa vizinhança com relação à América Latina, na qual as intervenções norte-americanas no continente passaram a ser mais sutis. A ideologia “yanque” passou a penetrar através de filmes, rádios e revistas, pois os investimentos dos Estados Unidos superavam os da Inglaterra neste período. Era a “América para os americanos” sendo posta em prática. O momento era de resguardar os seus dominados. Ianni, no seu “O Labirinto Latino Americano”, expõe o exemplo do Panamá e de Porto Rico, que o imperialismo do Tio Sam penetra não só economicamente, mas também culturalmente, influenciando o uso dos costumes panamenhos e porto-riquenhos conforme os seus interesses. Onde está a democracia num lugar onde seu povo não possui autonomia lingüística? Que democracia é essa que grandes empresas controlam grandes jornais, dominando assim o uso da notícia?
     Conforme Nelson Werneck Sodré, hoje, um grande jornal é uma empresa capitalista de grandes proporções. O domínio é exercido pela propaganda e pelo convencimento, onde o uso da força militar foi dispensado, tanto que, para este autor, na sociedade atual, quem possui o controle da imprensa não necessita mais de golpes militares, já que neste contexto os militares são postos em disponibilidade.
     As práticas anti-democráticas não é exclusividade apenas de países regidos pelo sistema capitalista. A União Soviética de Stálin reprimia seus compatriotas, perseguia, torturava e assassinava opositores. Os cubanos viveram mais de quatro décadas sob domínio de um chefe de Estado. O que tem de democrático nisso?
     Há mais ou menos três décadas atrás Michel Foucault desenvolveu uma teoria que a princípio era uma idéia inovadora e revolucionária, atualmente se transformou numa aceitação unânime entre os pesquisadores. A partir das influências foucaultianas, a história política deixa de se preocupar apenas com a organização e relações de poder no Estado, para analisar também as relações políticas entre grupos sociais diversos.
     Para Foucault não existe uma teoria geral do poder, ou seja, o poder não é algo que tenha natureza ou essência com características universais. O poder não é global e unitário, e sim uma prática social em constante transformação. Esse poder é caracterizado como micro-poder, pois apesar de não ser o poder estatal, penetra na vida cotidiana do indivíduo, intervindo diretamente e materialmente. O autor não considera o poder uma mercadoria, rejeitando assim o modelo econômico, ou seja, para ele é uma relação de força, onde não há uma disputa que se ganha e se perde, mas uma relação de dominadores e dominados.
    O poder está presente nos hospitais, nas universidades, nas famílias, nas escolas, porém o poder não significa exclusivamente tirania, pois como bem enfatiza o filósofo francês a dominação capitalista não conseguiria se sustentar baseada apenas na repressão, lembrando a análise de Sodré sobre a imprensa. As discussões para as tomadas de decisões entre a vanguarda e a retaguarda tornam aquele ambiente mais democrático, situação essencial para a convivência “pacífica” entre as classes.

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